O Valor dos Heróis
- rannison rodrigues
- 22 de ago. de 2021
- 4 min de leitura

Em 2018, uma amiga das aulas de yoga, me enviou, pelo Whatsapp, um vídeo. "Você tem que ver isso, tem tudo a ver com o que a gente estava conversando ontem." Obediente, cliquei no vídeo e comecei a assistir. Quando olhei o tamanho, quase desisti: mais de uma hora. E o título "O CAIBALION, cap. 3…" não me chamou a atenção de pronto. Na verdade, à época, nem sabia do que se tratava.
Mesmo assim, decidi honrar a indicação e continuar assistindo até onde conseguisse. Foi nesse dia que tive meu primeiro contato com Lúcia Helena Galvão. Passei o resto do dia vendo os outros capítulos da série. Nos próximos dias, eu compraria o livro para acompanhar a leitura comentada. Algumas semanas e muitos vídeos depois, minha visão de mundo estaria muito diferente. Meses depois, eu pediria demissão do emprego, viria do Rio de Janeiro para São Paulo, mudaria radicalmente minha vida e me tornaria membro de Nova Acrópole (instituição da qual ela é professora).
Dona Lúcia, como a chamo, foi um divisor de águas para mim. Meus heróis sempre foram homens: Mandela, Gandhi, Senna, Maximus (O Gladiador). Não que eu não admirasse os feitos femininos, mas sempre me espelhava em personalidades masculinas. Pensava, às vezes, comigo mesmo "Como Gandhi conseguia? Ele não tinha um vizinho desses…". Mas depois de conhecer Dona Lúcia, passei a pensar "O que ela faria nessa situação?".
Em 2019, decidi entrar para Nova Acrópole. Mas, como procrastinador de nível olímpico que era, fui deixando para depois. Fiz a inscrição, mas algo dera errado com o pagamento e optei por cuidar de outras coisas da vida ao invés de simplesmente resolver o problema e começar a frequentar as aulas. Já se passara uma semana desde o início do curso, quando, não mais que de repente, eu dei de cara com Dona Lúcia.
Lembro claramente da cena: ela vinha caminhando num passo tranquilo, olhando as vitrines na galeria do shopping, com algumas sacolas no antebraço esquerdo, uma bolsa de alça cruzando o tronco e uma blusa florida. As pessoas iam passando apressadas e eu, estupefato, fiquei imaginando como era possível ninguém ir até ela para pedir conselhos ou só dizer um "Oi!". Não fazia sentido, era como se Mandela estivesse passeando por ali e ninguém sequer notasse.
Não perdi a oportunidade. "Ah, eu vou lá!", pensei. E fui mesmo. Coloquei meu melhor sorriso de líder de excursão no rosto e fui cumprimentar minha heroína, minha mestra. "Professora Lúcia!" chamei. Ela parou e me olhou com um olhar tão sereno que eu, que estava atrasado para encontrar minha namorada, senti como se tivesse todo tempo do mundo. "Pois não?", respondeu ela. Meu coração disparou, minha mente também.
Eu queria dar um abraço nela, agradecer pelos ensinamentos, dizer que ela mudou muito a minha vida, perguntar 400 coisas, oferecer ajuda com as sacolas, convidá-la para um chocolate quente, tudo ao mesmo tempo. Mas o que saiu foi: "Posso tirar uma foto com a senhora?" e ela, simpaticamente, aceitou: "Claro, meu filho."
Eu estava atrasado e, dentro de mim, tinha a nítida sensação de que estava incomodando Dona Lúcia, mas, para minha surpresa, ela emendou: "Você sabe que eu sou de Brasília, né? Só estou em São Paulo porque vim dar uma entrevista." e eu precisava dizer alguma coisa. Não tenho dificuldades com isso mas, veja só, era a Dona Lúcia ali. Imagine um misto de admiração, reverência, ansiedade e estar atrasado. Nada muito brilhante vem nessas horas.
O que saiu foi "Sei sim, já vi todos os seus vídeos, professora. E acabei de entrar para Nova Acrópole aqui em São Paulo." e ela "Isso é bom…" e sei que ela, simpaticamente, falou mais coisas. Mas eu não pude ouvir. Estava sendo surrado pela minha própria consciência. Me despedi da minha heroína apressado e quando entrei no metrô, estava envergonhado e atordoado.
Bum! Minha consciência estava me socando, chacoalhando e me praguejando. "Mentiroso! Você é um mentiroso sem vergonha. Mentiu para Dona Lúcia." Encontrei com a minha namorada, expliquei o atraso, mostrei a foto, contei a história, mas algo continuava zumbindo no meu ouvido. Aí, confessei "Menti para ela, sabe? Disse que tinha entrado para a escola, mas ainda não entrei realmente." Minha namorada tentou me confortar, mas minha consciência continuava fazendo seu trabalho: "Mentiroso!"
Assim, no outro dia, a primeira coisa que fiz foi ligar para a escola e dar um jeito nas coisas. Passei a comparecer às aulas e desde então, tem sido um caminho realmente transformador. Essa história me mostrou o valor dos heróis. O peso que o respeito e a reverência têm na nossa vida cotidiana. Me doeu tanto contar aquela mentira para Dona Lúcia, que eu sentia que não conseguiria continuar enquanto não reparasse meu erro.
Veja, foi uma coisa tão potente que eu não conseguia "olhar para o lado", não conseguia fingir que estava "tudo bem". Eu simplesmente precisava reparar aquilo. Quando algo ou alguém te inspira a ser melhor do que é, quando você elege alguém para se espelhar, acho que certas coisas mudam. Mesmo que você seja um mentiroso ou um procrastinador, diante daquele herói é impensável aceitar uma baixeza dessas. Você precisa evoluir, precisa estar à altura, precisa merecer o seu herói. É como se houvesse um super-imã te puxando para cima.
Não sei quais são os seus ou as suas, nem se já teve a oportunidade de estar na presença deles, mesmo que só alguns instantes. Mas sei que, se você apenas imaginar que eles estão aí, do seu lado, não vai aceitar menos do que o seu melhor. Vai se sentir impelido a evoluir. Então, se puder, pense hoje em algum dos seus heróis. Lembre de alguém que te inspire a se elevar, imagine. Aí então, observe como se sente e preste bastante atenção, ele (ou ela) pode estar passando na sua frente de blusa florida e passinhos tranquilos, olhando as vitrines na galeria de um shopping. Boa segunda!
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